O anúncio sobre a chegada da Hooters em Recife, trazida por Roberto Bitu, Gustavo Satou, Thiago Figlioulo, Julio Maciel, Cristiano Falcão e Mauricio Falcão, trouxe consigo manifestações contrárias à exploração, objetificação e abusos cometidos pela lógica masculina heterossexista contra as mulheres. A repercussão destas manifestações ameaçou e combateu o poder masculino que, por sua vez defendeu o empreendimento, acusando as críticas de moralistas e outras barbaridades. Argumentos que só fazem sentido aos que são privilegiados por uma estrutura que sexualiza mulheres para serem vendidas como partes integrantes de um kit disponível aos homens. Sim, algo contemplado naquela máxima quando os homens são questionados sobre os seus maiores bens: “minha fortuna, meu carro e minha mulher”.
O sentimento de indignação em perceber que o projeto de requalificação urbana da cidade atraí empreendimentos que promovem a exploração e o abuso feminino, deixando a cidade ainda mais insegura para as mulheres, fez com que várias pessoas procurassem a Ouvidoria da Secretaria da Mulher do Estado de Pernambuco para apresentar a denúncia contra a chegada da rede de restaurantes.
Após a apuração das denúncias, a Secretaria divulga uma tímida nota de repúdio contra os estabelecimentos comerciais e marcas que exploram e utilizam a imagem e o corpo das mulheres como objeto para comercializar seus produtos. Sim, a nota é timída pois não cita o nome do estabelecimento nem absolutamente nadao que remete ao tal.* Apesar de reconhecermos a sensibilidade do órgão público ao se posicionar sobre o alerta das pessoas que não compactuam com a violência de gênero, pensamos que esta forma superficial e abstrata com que ela se apresenta não atua diretamente no combate contra a chegada da Hooters, e pior, não questiona o impacto que este estabelecimento trará na vida das afeminadas que vivem em um dos estados mais perigosos para mulheres do Brasil.
A rede pretende instalar-se nos Armazéns do Porto, empreendimento do Porto Novo Recife, financiado pelo governo estadual e estrategicamente planejado para impulsionar o turismo. Por isso, acreditamos que o poder público tem responsabilidade direta na implementação desta rede. Então, cabe a nós questionar a Secretaria da Mulher, que diz publicamente repudiar estabelecimentos da linha da Hooters, do porque poupar em denunciar o nome de uma marca que ressignifica e sofistica a cultura do abuso sexual.
Tendo em vista que os principais meios de comunicação do estado anunciaram a chegada da Hooters como algo inovador e positivo, bem como os empresários que pretendem investir no projeto, acreditamos que as cautelas legais, previstas em trâmites institucionais, neste momento não são suficientes para justificar a postura de não enfrentamento e não denuncia da rede. Perder-se nas burocracias legais/institucionais acaba por fortalecer o estabelecimento e seus investidores, tornando a segurança das mulheres que vivem nesta cidade, cada vez mais frágil.
Esta é uma pequena prova de que o Estado não será uma estância eficaz para emancipação e conquista das liberdades dos setores subalternos. As práticas das instituições jurídicas, executivas e legislativas mostram na prática, apenas favorecer a ordem hegemônica. Cremos apenas na potência de luta das mulheres, afeminadas e pessoas aliadas. Certamente, a nota mesmo que tímida, só foi possível graças a uma pequena pressão popular. Atentando a isto, incentivamos a criação de campanhas autônomas e articulações contra a implantação deste antro de exploração e abuso de mulheres.
Por fim, fazemos mais uma vez um apelo, aos grupos, coletivos e demais organizações que também vêem como absurda a instauração deste restaurante na cidade. Pensar a cidade, direitos dos animais, transportes, agroecologia, etnia, classe e meio ambiente, se isentando de se posicionar contra iniciativas exploratórias que se baseiam na submissão, além de uma extrema incoerência política, representa uma cumplicidade com as estruturas hegemônicas estabelecidas.
Dessa forma, gostaríamos não de desmerecer a nota de repúdio da SecMulher do Estado, mas afirmamos que precisamos urgentemente combater diretamente a chegada desse estabelecimento e citá-lo, bem como os seus investidores, é crucial para a efetivação da denúncia.