Ítalo Bazon e Roger de Renor denunciados por agressão e violência Machista no #ruralnoforte.

A Arca compartilha uma denúncia enviada por email, sobre agressão e violência machista no evento Som na Rural, ocorrida no último dia 30/08/2015, esta denuncia complementa nossa última postagem também enviada por email.

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“É brilhante como o machismo estrutural funciona de forma a proteger agressores… São engrenagens muito bem organizadas e eficazes. “Não vamos expor eles”, “eles precisam de ajuda”, “mas eles foram legais que só naquela vez, lembra?”. Macho transtornado merece escracho. Pela segurança e bem-estar das mulheres. Ponto.” Viq Vic.

O roteiro é o mesmo aqui e em qualquer lugar, quanto mais empoderadas, firmes, combativas e não frágeis as vítimas do machismo se apresentam, mais violências e tentativas de dominação planeja a inconformada supremacia machista. No dia 30 de agosto de 2015, última edição do Som na Rural realizado no Forte das Cinco Pontas, o machismo estrutural ocorreu bem do jeitinho que manda o figurino. Violência, intimidação e ameaça de afeminadas, agressão física às pessoas trans, acolhimento do agressor pelos machos do evento, deslegitimação, hostilidade e como toque final perseguição das trans e novas ameaças do agressor, agora protegido pelos machos organizadores.

Acompanhado de uma amiga, Ítalo Henrique Bazon, macho transtornado (aquele que faz questão de demonstrar em público sua virilidade, exaltação, estupidez e imponência) recentemente denunciado por agressão e violência machista, visivelmente furioso e de mal humor ficou extremamente irritado com uma trans não binária1, no momento em que ela respondeu a hostilidade expressa por ele ao ir cumprimentar sua amiga. Sendo bruto, violento e ameaçador a trans resolveu sair de perto.

Logo depois a trans acompanhada de outra amiga não binária, se deparou com a mulher que acompanhava o macho – nesse momento sozinha – e resolveram ir trocar uma ideia com ela. Ela aparentemente não tinha concordado com as atitudes do macho e depois de iniciada uma conversa, caíram num papo sobre desconstrução, violência machista e relações de poder. É exatamente no momento que se falava sobre a dificuldade de desconstrução frente a atitudes e comportamentos que agregam poder, que o macho nos localiza, vem em nossa direção e inicia ameaças às trans, com voz e mãos levantadas, expressando um ímpeto de agressividade e coação extremamente opressivo. A outra amiga trans, começa a falar pro macho cair fora e “abaixar a bola”, a mulher também tenta contê-lo, mas a truculência machulenta era desmedida, e desta vez, já não mais contido, ele vem com a clara intenção de bater. É neste momento que ele leva um chute na região genital. A confusão foi instalada, e agora o macho muda de foco, deposita toda sua raiva na trans que tentou combatê-lo, com a explicita intenção de bater e mostrar sua pseudo-superioridade. Quando a situação chega no ápice da violência, a mulher, executando técnicas de autodefesa afeminada, consegue de forma exemplar conter o macho e afastá-lo do local que estavam as trans, mas, sem mais apoio, isto não duraria muito, a confusão já fora instalada e todos os olhos já estavam aptos a condenar e hostilizar as trans que comprometeram “o clima de paz” do evento.

O machismo estrutural e naturalizado na cabeça da sociedade é cego em perceber as desconfortáveis, tiranas e violentas situações que mulheres, bichas, travestis e pessoas trans estão condenadas. Então, no momento de reagir, de não aceitar a submissão e autoridade abusiva dos comportamentos masculinos estas pessoas são automaticamente colocadas como ‘personas non gratas’ e estraga prazeres (prazeres, ler-se: abusos e coerção machista naturalizada). É muito engraçado verem as pessoas falarem de paz, sem considerar o cotidiano nada pacífico que a sociedade heterossexista2 submete as questionadoras do machismo. O evento Som na Rural não é um espaço de paz para mulheres, bichas, travestis e trans.

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Mas não acabou, ainda tem o pior. Devido a confusão instaurada, alguns outros machos da organização do evento, incluindo Roger de Renor se aproximaram na intensão de acalmar a confusão. Este é o momento que o macho agressor está cercado de outras pessoas e Roger diz clara e explicitamente estar ao lado do agressor. Sem nenhum pesar se coloca como cúmplice do agressor. A posição de Roger de repúdio a uma das pessoas trans que estava envolvida nesta confusão se constrói numa edição anterior do Som na Rural realizada na época da Ocupação do Estelita, na ocasião, o produtor cultural convidou Ortinho, acusado e escrachado pela opinião pública local por fazer apologia ao estupro e proferir mensagem de violência a mulheres. Na época a ocupação do Estelita contou com um forte debate sobre violências sexistas e com uma intensa combatividade contra machos agressores que estavam na ocupação, foi um período de muito acúmulo sobre pautas e questionamentos feministas e de empoderamento antisexista, e na contramão de toda esta vivência Roger tenta trazer para o Estelita um apologista do estupro. Inconformadas com tal situação, as afeminadas ocupantes do Estelita, pediram voz para problematizar a situação no microfone e quando começaram a falar tiveram o microfone cortado, uma das justificativas saídas pelo pessoal do som: “Ortinho é meu amigo”.

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Fora do palco uma discussão aconteceu e Roger acusou a mesma trans envolvida na situação aqui descrita de querer se promover sugerindo que se inscrevesse no Big Brother. O que acontece de fato é um macho, branco e heterossexual dizendo que a denúncia de cumplicidade machista ocorrida naquele espaço é uma estratégia de exibicionismo, nada mais deplorável, revoltante e anti-feminista. Na realidade um ser que goza de múltiplos privilégios e vive num ambiente onde impera o estrelismo, o alpinismo social, o status pela acumulação de capital cultural e a arrogância poserista, atua estimulando vivências conflitivas e covardes, além de seguir deslegitimando a urgência de setores estigmatizados de problematizar desigualdades políticas no cotidiano.

É a partir das nossas relações e situações diárias que se estrutura os grandes sistemas de poder. Pensar direito à cidade, protagonismo popular e ocupação dos espaços públicos sem considerar as relações impostas pela estrutura capitalista, soa ingênuo, mas também assimilador, escroto e desonesto ao considerar que tais questionamentos agregam pessoas e possibilitam acumulação de poder e visibilidade por parte de quem pensa política desta forma tão superficial, insuficiente e vitrinista.

Desta vez, Roger aproveitou a oportunidade para se aliar ao agressor e estimular a hostilidade às trans com pelo menos outros cinco homens que acompanhavam o agressor, deixando-o em situação de conforto e agora com “justos” motivos para expressar sua violência machista. Roger ainda agiu em cumplicidade ao agressor ao ser visto deslegitimando a trans para outras pessoas invertendo o polo da história e apontando as pessoas trans com algo que o homem branco heterossexual não quer ser associado: violentas, agressivas, as que implodem os espaços, baderneiras e loucas. Devido ao apoio de Roger e a aliança com outros cinco machos o agressor se sentiu confortável e protegido para seguir com seu transtorno: foi caçar às trans.

italoagressaoGraças aos organizadores do evento foi criado um clima de vulnerabilidade e tensão. Ao procurar ficar junto de outras amigas e em espaços com maior concentração de pessoas as trans foram perseguidas pelo macho que invadiu o grupo onde estavam, voltando a ameaçar e intimida-las. Voz alta, mãos levantadas, dedo na cara, agressividade e uso do corpo para empurrar pessoas e declarar um novo confronto, só que agora protegido pela organização do evento e apoiado por outros machos tão escrotos quanto ele. Neste cenário de intensa insegurança as trans decidiram ir embora e os machos unidos mais uma vez ganharam o espaço. Nas redes sociais o agressor, diz ter tido uma discussão conversado com amigos dos envolvidos e resolvido o caso. O que este infeliz chama de discussão, nós chamamos de violência machista, o que ele diz ter sido resolvido para nós resume a nossa expulsão do espaço.

Roger não foi cúmplice a toa, diariamente vemos agressores proferirem violências abaixo de tantos olhos durante tanto tempo. Torna-se explícita a falta de vontade em priorizar e se posicionar sobre as situações que colocam os machos em posição de questionamento e ameaça a seus postos de poder tão bem protegidos pela solidariedade entre MACHOS. Sabemos que não existem cúmplices a toa, não existem cúmplices apenas por inércia, cúmplices existem porque se assemelham com agressor, porque também cometem violências, porque estar ao lado do agressor é uma estratégia de proteção masculina e de deslegitimação de corpos dissidentes da heterossexualidade compulsória3.

O fato denunciado expressa a imensa ofensiva heterossexista contra a combatividade e declaração de insubmissão por parte das vítimas do machismo. É abominável que um evento e um projeto como Som na Rural, que se apoia em discursos políticos, tenha atitudes explicitamente oportunistas, covardes e canalhas, silenciando críticas contra comportamentos machistas, servindo inescrupulosamente como base de fortalecimento para ameaças e intimidações contra pessoas trans e pior, usando as ideias de democracia e direito à cidade apenas para acumular capital cultural e agregar valor político. Queremos deixar bem claro, para mulheres e dissidentes sexuais que este evento e seus organizadores ESTIMULA A VIOLÊNCIA MACHISTA E ISTO NÃO DEVE SER TOLERADO. Recife passa por um momento de intenso questionamento sobre questões de gênero e sexualidade, articulações e movimentações em perspectiva feminista, transfeminista, sexo-dissidentes e libertárias tem tensionado sobre pontos extremamente naturalizados da violência patriarcal.

Recentemente Lírio Ferreira e Cláudio Assis protagonizaram outro caso desgastante de machismo e misoginia e a problematização contra o show de machulencia dos dois deu a luz uma série de denúncias sobre abusos e assédios contra mulheres. Esta nota também se dá numa tentativa de ascender outras situações de violência e agressão sexista que os machos aqui denunciados estão supostamente envolvidos. Admitindo a pertinência do questionamento contra ambientes/pessoas que estão tão acostumadas a serem bajuladas e não criticadas alegamos que Perversidade é proteger agressores e assim, agredir novamente. Perversidade é saber que esses caras, não importa o que façam, são acobertados pela tal brodagem machulenta e misógina da cena cultural pernambucana.

A misoginia, transfobia e violência machista imperante nos comportamentos que enfrentamos no cotidiano não deve ser relativizada, pelo contrário é importante que não nos calemos e sempre nos apresentemos combativas e dispostas a ação direta quando o assunto é violência machista. É com a máxima O pessoal é político”, que encerramos esta nota tentando estimular discursos críticos, questionamentos e responsabilidade aos fazeres dos agressores aqui citados e com a intensa e sempre ativa capacidade de combater e denunciar atitudes que violentam e silenciam as vítimas estruturais do machismo e da heterossexualidade compulsória.

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1
– Trans não binária são pessoas que transgridem o gênero e/ou a sexualidade e não se identificam necessariamente com nenhum dos gêneros binários instituídos pelo heterocapitalismo, sua ciência, suas corporações e seus Estados. O binário de gênero é a insistência em que homens são masculinos e mulheres são femininas. Isto reduz as opções para que as pessoas ajam fora de seus papeis sociais de gênero sem caírem no esteriótipo das outras. Ademais, homem e mulher não necessariamente traduzem-se como masculino e feminino este significado atende apenas a interesses politicamente contextualizados e opressivos.

2Heterossexismo é a atitude de preconceito, discriminação, negação, estigmatização ou ódio contra toda sexualidade que não seja a heterossexual. Uma sociedade heterossexista é aquela que supõe que naturalmente todas as pessoas são todas heterossexuais ou de que a heterossexualidade e seus valores (monogamia, família nuclear, ativo X passivo) é superior e mais desejável do que as demais possibilidades sexuais.

3 – O termo heterossexualidade compulsória foi criado pela feminista Adrinne Rich em 1980 e refere-se a doutrinação heterossexual que todas as pessoas estão submetidas. Na heterossexualidade compulsória a experiência não-heterossexual é problematizada, patologizada, é considerada algo a ser explicado, buscando um marco para o seu aparecimento. A lesbofobia, homofobia, transfobia, bifobia são algumas das múltiplas expressões violentas que tentam manter compulsoriamente uma normalidade heterossexista.

Machismo Mata: Neto Tavares, dopping e estupro.

Machismo Mata
Machismo Mata

Os presentes casos que serão apresentados não são histórias de ficção, são trágicas narrativas que se repetem incessantemente na vida de milhares de mulheres por todo o mundo, todos os dias. Tratam-se de relatos sobre violência sexual, objetificação, perseguição, manipulação, assédio e propagação de inverdades sobre a vida das mulheres, que aqui são apresentados em caráter de denúncia.

JOSÉ CORREIA TAVARES NETO: este é o nome de mais um “rapaz de família”, homem jovem, branco, cis, heterossexual, classe média alta, bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Chegando em Recife, oriundo de Caruaru, NETO TAVARES (como é conhecido) começou a se aproximar de diversos movimentos e organizações de esquerda, apresentando uma postura supostamente aberta às pautas sociais, tais como a desigualdade social, o combate à lgbtfobia, ao racismo, chegando até a se apresentar como pró-feminista em diversos espaços – em que pese a visível diferença entre o seu discurso e a sua prática, haja vista que Neto jamais chegou a se organizar em qualquer coletivo ou movimento.

Ainda assim, entre muitos e muitas militantes – sobretudo entre as mulheres –, Neto era um rapaz considerado como um amigo e/ou companheiro, uma pessoa em quem aparentemente se podia confiar. Ocorre que por trás dessa aparente postura “militante”, escondia-se um homem que, no auge do usufruto de seu privilégio social, manipulava, mentia, assediava e estuprava mulheres, utilizando-se de métodos absolutamente covardes para conseguir seus objetivos, e ameaçando suas vítimas. Aqui constam pelo menos quatro de uma infinidade de relatos que se seguem e que, a cada dia, só aumentam.

O primeiro deles conta a história de uma mulher que, além de sofrer assédio moral e psicológico durante uma relação doentia, controladora e abusiva produzida pelo agressor, foi constantemente humilhada, traída e violada, sendo, inclusive, drogada com LSD enquanto dormia para que ele a violentasse. Durante o namoro com esta mulher, o agressor não apenas a violou de diversas formas, como se relacionou com outras mulheres e constantemente assediava suas amigas mais próximas.

Já o segundo caso diz respeito à narrativa de uma mulher que foi dopada em um bar pelo agressor, e que após ingerir uma bebida oferecida por ele, perdeu completamente o controle de seu corpo e de sua consciência. No dia seguinte, ela acordou despida na cama do agressor, cuja frieza e a completa falta de respeito à condição de sujeito dela são absolutamente revoltantes, sobretudo pela postura dissimulada e cínica adotada pelo denunciado.

A sociedade em geral, e as mulheres em específico, são constantemente induzidas a pensar que o perfil do estuprador é de um desconhecido que estará à espreita, numa rua escura, pronto para fazer da oportunidade uma chance concreta de violência sexual. No entanto, dados recentes apontam que 70% dos estupros são cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos da vítima, indicando que, na contramão do senso comum, os agressores, em geral, fazem parte do ciclo social da vítima.

O terceiro relato parte de uma companheira lésbica que, mesmo tendo uma relação de amizade com o agressor, foi assediada diversas vezes, culminando numa situação de violência sexual. Nesse momento observa-se que Neto Tavares abusou da confiança nele depositada para praticar o estupro enquanto a vítima dormia. Ao acordar, ela se deparou com sua roupa aberta e o toque do agressor dentro da sua calcinha, enquanto o mesmo se masturbava. Sendo questionado sobre o que estava fazendo, o autor não se constrangeu com a situação afirmando que a vítima deveria gostar do que estava acontecendo, ou seja, reafirmando o ato.

Resta evidente que, imbuído de seus privilégios sociais e em pleno exercício de uma cultura de estupro cotidianamente reforçada pelas estruturais sociais patriarcais, Neto Tavares desrespeita a autonomia, a autodeterminação, a liberdade e a dignidade humana das mulheres. Ele apenas as enxerga e utiliza como objetos de livre acesso disponíveis ao seu prazer individual, ignorando e desconsiderando a livre orientação sexual feminina, na medida em que fetichiza a lesbianidade a serviço de sua própria heterossexualidade. Como se já não bastasse o reforço e exercício à cultura de estupro, José Correia Tavares Neto, que já assediava a vítima deste terceiro relato, camuflando suas investidas de “brincadeiras” há bastante tempo, compactua e pratica a ideia de que a lesbianidade existe em função do fetiche e prazer hetero-masculinos.

O quarto relato dispõe sobre a narrativa de uma companheira que, após interromper um relacionamento breve com o agressor por ter passado por diversas situações de desrespeito e humilhação, foi ostensivamente assediada por este para que os dois ficassem novamente. Após a negativa, o autor propagou diversas inverdades difamatórias a respeito dela, afirmando que havia transado com a vítima naquela noite. A dificuldade em aceitar um “não” que o autor possui fica muito evidente nesta situação, observando o contexto de seus atos, sobretudo quando se constata que diversas pessoas estavam presentes na situação e viram que nada aconteceu, além do assédio ostensivo de um homem sobre uma mulher que o rejeitava continuamente. Para todos e todas ali presentes, estava claro que quanto mais negativas ele recebia, mais a assediava, na tentativa de afirmar sua masculinidade, desconsiderando completamente a autonomia de vontade daquela mulher.

Estes quatro relatos foram trazidos à luz para expor as diversas formas de atuação que o agressor utiliza para conseguir aquilo que quer: vantagens sexuais mediante métodos violentos, indignos e cruéis. Aproveitando-se da condição de “amigo” e da boa relação nos meios sociais das vítimas, Neto circulou livremente e continuou praticando uma série de agressões de caráter eminentemente machista. Ainda que cada uma dessas histórias possua características próprias, é importante destacar que todas elas revelam uma raiz comum, que está imbricada no privilégio social estruturalmente concedido a homens como Neto Tavares, para agirem como se possuíssem um manifesto direito “natural” de livre acesso aos corpos das mulheres, independente da vontade destas. Ignorando deliberadamente a humanidade delas e subtraindo sua subjetividade, tratando-as como “coisas” – em outros termos, coisificando mulheres em objetos sexuais disponíveis ao seu bel prazer.

Igualmente, cabe destacar que, como toda denúncia feita por mulheres contra a violência de gênero, não faltam defensores do status quo machista prontos para abafar a verdade rasgante que aqui pretendemos gritar. Há quem queira nos calar dizendo que “elas quiseram”, ou que “estão mentindo” ou que “mereciam”, ou, ainda, que se fosse verdade estas teriam procurado a polícia de imediato. Estes insensíveis, que exercem uma fraternidade exclusivamente masculina, tendem estar a postos para automaticamente desacreditar as vítimas e abafar suas vozes, exigindo denúncia como requisito da verdade. O maior problema desse processo é que ele desconsidera o trauma da vítima como se o silêncio enquanto reflexo do peso da vergonha, da condenação moral social, da tortura que é a exposição de situações tão íntimas, fosse apenas um mero detalhe a ser ignorado.

Àqueles que acham que a vida é uma equação matemática, e que engrossam as fileiras amordaçantes do machismo, que estão prontos para culpabilizarem as vítimas por motivos absolutamente irrelevantes à violência cometida contra elas, ou para lhes oferecerem o pior de si mesmos, ameaçando-as, assediando-as e difamando-as – como vem ocorrendo – oferecemos o nosso grito conjunto: NÃO PASSARÃO!

Como Neto Tavares e seus amigos, que agem enquanto cúmplices, existem muitos outros, infelizmente, mas é por isto que avisamos que não nos deixaremos intimidar! É justamente contra o que vocês são e representam que nós, mulheres, nos organizamos e lutamos. Estamos juntas, somos fortes, e jamais nos calaremos frente às situações de opressão.

Mulheres, protejam suas irmãs, denunciem à sociedade, compartilhem estas informações. O silêncio e a omissão contribuem para a invisibilização da violência e para a continuidade e perpetuação deste ciclo de agressões. Quem se cala não necessariamente consente, mas indiretamente fortalece o opressor. GRITEMOS!

Articulação Combativa Antissexista – ARCA (PE)
Articulação de Mulheres Brasileiras – AMB (BR)
Colativa (PE)
Coletiva Bruaca (BA)
Coletivo Ana Montenegro (PE)
Coletivo “Nova História”. (PE)
Coletivo Feminista Dandara (SP)
Coletivo Feminista Diadorim (PE)
Coletivo Feminista Marli Soares (PE)
Coletivo Gaiola (BA)
DACINE (PE)
DHUZATI – Coletiva Vegana de Comida Artesanal (PE)
Fórum de Mulheres de Pernambuco
Frente Feminista da UFBA (BA)
Feminismo Agora!
Flores Crew (PE)
Flores do Brasil (BR)
Grupo Curumim (PE)
Grupo Maria Quitéria (PB)
Juntas! (PE)
Frente de Mulheres dos Movimentos do Cariri (CE)
Marcha das Vadias Recife (PE)
Marcha Mundial de Mulheres – Núcleo Soledad Barret (PE)
Movimento Faça Amor e não faça chapinha (PE)
Movimento Mulheres em Luta – MML (PE)
Ou vai ou Racha (PE)
Plenária de Mulheres do SAJU – Direito USP (SP)
Secretaria Mais Mulher – SASAC (Sociedade de Apoio Sócio Ambientalista e Cultural) (SE)
Secretarias de Mulheres do PSTU (PE)
Setorial de Mulheres do Movimento Zoada (PE)
SOS Corpo (PE)

Seis explicações contra os argumentos machistas que defendem a Hooters

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Diante da repercussão da posição da ARCA sobre a chegada da rede internacional de restaurantes Hooters e da incompreensão por parte de algumas pessoas do que isso representa, resolvemos abordar alguns pontos do debate, só que dessa vez, de forma mais pedagógica, levando em consideração os argumentos mais repetitivos desta historia toda.

Nosso objetivo é que a discussão continue a fluir, de forma a aprofundar a compreensão sobre a lógica violenta na qual se estruturam as nossas cidades. O texto objetivo e pontual de outrora com certeza trouxe muitos desconfortos, não apenas por uma possível falta de habilidade nossa, mas também pela profunda naturalização do machismo presente na sociedade e pelo insistente reforço em querer assegurar, de acordo com a lógica capitalista, o corpo da mulher enquanto mercadoria.

Solicitamos aos leitores maior abertura para ler o que se segue. A missão de se compreender uma mensagem depende em muito da boa vontade de quem a lê.

{02d29c0b-c651-4024-b28f-d76a75f24ad4}_dsc_00021 – O que tudo isso tem a ver com a “revitalização da cidade” e porque o Estado tem sim responsabilidade sobre isso? Além de acharmos, por si só, a existência do restaurante extremamente problemática, a unidade da Hooters na cidade é um empreendimento dentro do Projeto Novo Recife. Cremos que não é só apenas as torres do Consórcio que compõe o projeto, afinal o empreendimento que revitaliza a zona portuária da cidade também usa a alcunha ‘Novo Recife’. O que estamos querendo dizer é que o projeto de desenvolvimento urbano está voltado não só para um poder de consumo mais elevado, ligado ao mercado turístico, mas é composto por empreendimentos que exploram sexualmente a imagem feminina. Minimamente, podemos afirmar que um projeto que prevê um tipo de estabelecimento como o Hooters não considera uma realidade de violência sexista concreta na cidade e pior, com base em argumentos de liberdade – de perspectiva liberal – naturaliza a objetificação do corpo do mulher. Você não acha no mínimo complicado o Estado numa Parceria Público/Privada permitir que uma rede como a Hooters se abulete no meio do Recife Antigo, um dos nossos cartões postais, e em vários aspectos contribua para a reprodução da violência sexista? E o papel do estado em coibir essas violências onde fica? Ou não podemos responsabilizar o Estado por isso?
Um empreendimento de requalificação urbana que admite em um modelo de negócio que vende e se sustenta com a exploração de trajes sexualizados, sofistica o consumo sexual do corpo feminino. É uma forma de normalizar e atenuar a prática abusiva do assédio e fazer vista grossa para os comportamentos e hábitos masculinos desrespeitosos e violentos. No processo seletivo, as Garotas Hooters são treinadas a fugirem de cantadas e como falamos acima, são obrigadas a assinar um termo afirmando e reconhecendo que podem sofrer abusos. Desta forma, ao admitir este tipo de negócio de alto consumo, num grande projeto de estruturação urbana, o poder público colabora para construção de ambientes não seguros para mulheres, permite a expansão do consumo elitista de mulheres como entretenimento masculino, – o que representa uma estratégia de normalização – além de impulsionar a cultura machista na cidade, algo que definitivamente reverberará e trará drásticas consequências às todas as mulheres e afeminadas da sociedade. Isto representará um imenso retrocesso. No mundo inteiro, meninas e mulheres sofrem com assédio, machismo e violência nos espaços públicos. O medo, muitas vezes, impede que elas façam algum trajeto, limitando seu ir e vir na cidade. Isso acontece porque o espaço urbano não é planejado pensando nas mulheres e afeminadas, e o Novo Recife está ai para provar isso!

Hooters2 – Uma busca no google (ou no DuckDuckGo o buscador que não vende sua vida a empresas.) com o nome da franquia Hooters e o site da rede são bem claros, a proposta não é a venda de comidas, mas das mulheres em forma de produto. É ingênuo acreditar que se trata unicamente de um restaurante comum, que “famílias frequentam e isso não tem nada de mais” ou que “é um bar como outro qualquer”. Olhem os detalhes no site e me digam se realmente não há problemas em uma franquia internacional que expõe como propaganda mulheres semi nuas envoltas em lutas de UFC, jogos de beisebol e costelas suínas, te dizendo: “ao chegar no nosso bar você não só vai ver a sua luta ou o jogo do seu time, mas ser servido por belas mulheres com seios volumosos a mostra” se você não enxergou o problema é porque provavelmente você se satisfaz, tira vantagem com esta exploração sexual ou por alguma espécie de cegueira desconhecida (rs). Realmente se faz necessário isso pra vender cebola empanada e chopp gelado? Nós acreditamos que isto não faz nenhum sentido, mas sabe porque o senso comum não se dá conta dessa bizarrice? Porque a sua, a nossa consciência, já esta habituada a ver mulheres sendo vendidas como partes integrantes de um kit disponível aos homens – mulheres, bebidas, muita carne vermelha e futebol e isso é tão natural que as famílias não veem problemas em levar seus filhos para esses espaços, é tudo normal.

A hipersexualização das mulheres está nos outdoors, nas revistas, nos programas de TV, nos catálogos de moda, nas publicidades e em casas noturnas, isto não representa um problema em nossa sociedade, pelo contrario, é necessário para que as mulheres tenham algum valor, pois esta é uma das formas que a sociedade nos oferece para sermos úteis no mundo. Pela hipersexualizacao dos corpos femininos as mulheres e pessoas afeminadas são impelidas a vender o que a sociedade consome: seus corpos. Se você inverter a lógica vai perceber que aos homens e seres masculinos são reservadas mais possibilidades de emprego que não envolvam seus corpos e suas sexualidades, mas para as mulheres e seres afeminados, vender sua força de trabalho sexual é sempre uma alternativa. A grande questão aqui é que as mulheres e todxs xs individuxs podem e devem obter o seu sustento da melhor forma que optar, mas existe uma lógica que faz com que alguns corpos afeminados sejam vendáveis e outros bem menos. O que os defensores da Hooters não percebem é o quanto essa naturalização da mulher enquanto objeto sexual, sexo frágil e muitas vezes como servas dos homens tem consequências desastrosas, como a violência física, exploração sexual e o tráfico de mulheres. Não acreditamos em objetificação sexual light, ou exploração sexual leve, menos danosa e mascarada como a Hooters faz nos seus restaurantes.

f33 – Aí você me diz que as mulheres “estão ali porque querem e gostam do que fazem”. Em um ponto concordamos, de fato xs indivíduxs possuem uma agência que xs motiva a agir de um jeito e não de outro, e que (até onde sabemos) os empregadores não colocam facas nos pescoços das mulheres e as obrigam a trabalhar lá. Mas existe uma outra questão que impede o que você chama de “liberdade individual” e “livre iniciativa”, cremos que ela é uma ilusão. Ao dar uma pequena observada em nossa sociedade e nas nossas próprias atuações dentro dela percebemos que a grande maioria de nós, principalmente as pessoas de classes mais populares, já trabalharam ou trabalham em empregos que não gostam e não lhes satisfazem e que o imperativo financeiro é condicionante para “passar um tempo, até me organizar”, muitas vezes este tempo é uma eternidade. Dificilmente é possível acreditar que uma pessoa se sinta realizada com o tipo de trabalho que faz no McDonald’s ou do Subway, apesar de sabermos que existe uma pequena exceção. A vida capitalista faz com que o emprego seja uma necessidade, para pagar as contas, para comer, para morar bem. A estabilidade do emprego sempre se coloca a frente das necessidades subjetivas, dos prazeres, dos projetos políticos e muitas vezes das aptidões pessoais. Não é por acaso que a depressão é uma das doenças que mais afastam trabalhadores das empresas atualmente, também não é por acaso o alto índice de pessoas com depressão nas cidades. O Estabelecimento que se utiliza da liberdade das mulheres de estarem lá porque querem” para vendê-las junto com pedaços de animais mortos, acaba por contribuir para que essas violências aconteçam. As Garotas Hooters são obrigadas a “reconhecer e afirmar” que o conceito do bar é baseado no apelo sexual feminino e que no ambiente de trabalho podem ocorrer situações desagradáveis de desrespeito e assédios. Me diga você o que pode acontecer com essas mulheres que estão lá trabalhando em um dia de luta de UFC, madrugada a fora quando a maioria masculina embriagada resolver “tirar uma onda” no estabelecimento… Será que elas serão culpabilizadas pelo desrespeito que podem sofrer? Por ter assinado um termo onde se declaram cientes disso? Pense com carinho, sem dizer a primeira coisa que a sua mente reproduz, com um pouco de cuidado você se dará conta do que pode acontecer com elas.

4 – Pessoas que fazem o uso do termo liberdade, para justificar o tipo de emprego oferecido pela Hooters, deviam reconhecer que homens são proibidos de serem garçons neste bar, que além disso muitas mulheres que fogem de um padrão de beleza objetificado também são proibidas de trabalhar lá. Na realidade a Hooters tem um manual severo de conduta e impõe na cabeça das funcionárias que elas precisam realizar atividades extra oficiais, para assegurar o emprego. Um estabelecimento que tem como hábito apenas selecionar ‘gostosas’ desrespeita quem não atende os padrões de beleza machistas. Quantos destes homens que defendem a Hooters perderam oportunidades de empregos por não serem bonitos ou gostosos? – sim, porque grande parte deles são horrorosos e nem um pouco gostosos por sinal (rs. rsrsrs). Se o serviço é de atendimento, a mulher não tem obrigação de ser gostosa, muito menos de tentar manter ou atingir um padrão de beleza machista para conseguir um emprego. Vocês acham realmente que isto tem alguma coisa a ver com liberdade?

5 – Os defensores da Hooters parecem não saber que a rede tem várias pedras legais em seu calcanhar, em 1997 a Hooters foi condenada a pagar 3,75 milhões por ter discriminado e negado emprego a três homens nos Estados Unidos, em 2004 várias mulheres entraram com ação na justiça estadunidense por ter sidos filmadas por câmeras escondidas enquanto se despiam. Para os amantes do direito, o acesso ao emprego baseado por motivos de sexo, cor, estado civil, é proibido pela Constituição Brasileira. E o que isso diz sobre a rede de restaurantes? Bem, nos diga você!

960x720_179216 – Fundamentalistas religiosas ou moralistas é um termo que não nos cabe. Não estamos indo contra os shortinhos que as Garotas Hooters vestem, muito menos contra seus decotes, estamos indo contra mulheres terem que vestir shortinhos e decotes para serem o principal produto de atração de um restaurante, sim porque elas deixam de ser Anas, Marias e Claúdias, para serem um objeto sexual. Defendemos o direito das mulheres andarem como queiram, com burca, com shorts, topless, de calças, sem camisa e até nuas, apenas somos contra alguém lucrar pela forma que uma mulher deseja se trajar ou imponha um traje para o trabalho que a transforme num produto, isto se chama coisificação e objetificação do corpo feminino e é exatamente isto o que transforma mulheres em mercadoria. Também lutamos pela liberdade sexual e temos certeza que sem ela é impossível existir corpos livres. Nos impressionam ver os homens que defendem a Hooters falar em liberdade das mulheres. Atualmente, as mulheres não tem liberdade para interromper uma gravidez indesejada, queremos saber o que eles estão fazendo para garantir as liberdades femininas que não cruzam com seus desejos sexuais. A nossa questão é com o sistema capitalista que é machista, racista e que se apropria dos corpos das mulheres e afeminadas para lucrar em cima deles. Seja para fins sexuais, seja para limpar o banheiro ou fazer um almoço, o sistema se apropria dos nossos corpos para servir uma classe dominante, branca, rica e heterossexual.

Nossa tentativa de trazer estes tópicos se faz com o objetivo de contribuir para um maior aprofundamento do debate, tão precarizado pela naturalização do senso comum machista. Nossa posição é norteada por princípios anticapitalistas e anti-autoritários, por isso cremos na interseccionalidade das lutas como algo elementar para a construção de uma realidade plural, diversa e justa. Outros pontos que abordamos no texto original como como tráfico de mulheres, exploração de animais não humanos, projeto de requalificação protagonizado pelo monopólio de grupos corporativos, estratégias de pressão e a subordinação mercantil de pessoas pelo advento do emprego capitalista, se faz neste momento, sem oportunidade de análise, haja visto a profunda convicção dos defensores da Hooters com os ideais hegemônicos antropocêntricos, capitalistas e machistas.

Admitimos, sem dúvidas, uma possível ‘falha pedagógica’ na objetividade do texto e na incisividade combativa. Contudo, gostaríamos de dividir esta responsabilidade, com nossxs parceirxss de luta e grupos que publicizam uma postura crítica ao capitalismo, mesmo com todas suas contradições. Novas visões de mundo em relação ao gênero, etnia, classe, sexo, cidades, agricultura, animais não humanos, meio ambiente e transporte não se consolidarão com esforço “somente das feministas”. A construção de uma realidade plural passa por vários campos. Desta forma, assumir, posicionar-se e ter postura contundente contra iniciativas exploratórias que se baseiam na submissão, se faz uma mais que uma responsabilidade, é um compromisso social.

ARCA – Articulação Combativa Antisexista